O BNDES chegou na semana passada à terceira idade, aos 65 anos
de fundação, e terá pela frente o desafio de equilibrar a distribuição de
crédito. Um levantamento feito pelo Núcleo de Jornalismo de Dados do GLOBO
aponta que, além de apresentar queda de valores contratados em 2016, o apoio do
BNDES é restrito a um pequeno número de empresas. No ano passado, apenas 13
companhias abocanharam financiamento de R$ 12 bilhões, 51% do montante
contratado em operações diretas e indiretas não automáticas, que são aquelas
com valores superiores a R$ 20 milhões e nas quais é necessária análise prévia
da diretoria do BNDES.
Embora
concentrem mais da metade das operações de financiamento, essas empresas
representam 6% do total de pessoas jurídicas (entre empresas, governos e
entidades) que conseguiram apoio do banco nessa categoria de fomento em 2016. A
maior parte delas é do setor de comércio e serviços em eletricidade e gás. O
levantamento mostra que, desde 2002, o apoio direto e indireto não automático
do BNDES apresenta alta concentração.
No
ano passado, o banco somou contratos de R$ 24,1 bilhões nessas operações,
metade do registrado em 2015 e em patamar semelhante ao de 2006. Nesse mesmo
período, também caiu pela metade o número de pessoas jurídicas que fecharam
financiamento nessas modalidades de operação, de 400 para 201. Em nota, o BNDES
argumenta que o número de empresas financiadas variou consideravelmente nas
operações diretas e indiretas não automáticas e que, por isso, não é possível dizer
que houve aumento de concentração entre 2015 e 2016. Segundo o banco,
proporcionalmente a concentração se manteve a mesma nesse período e ficou em
patamar semelhante ao dos últimos anos.
O
BNDES ressalta ainda que as operações diretas e indiretas não automáticas
representam cerca de 40% das contratações e que a distribuição dos recursos
nessas modalidades não é representativa do desempenho operacional do banco como
um todo. “Esse tipo de empréstimo geralmente é tomado por grandes empresas,
outro fator que tende à concentração de valores por empresa contratante”, diz o
texto.
Paulo
de Carvalho Lins, do Ibre/FGV, destaca que, com a menor oferta de crédito, a
estratégia do BNDES é oferecer financiamento para empresas mais sólidas. O
pesquisador lembra que esse perfil é semelhante ao das companhias que receberam
aportes na última década.
—
“O aumento de desembolso que a gente viu no período pós-2007 favoreceu empresas
mais velhas, menos arriscadas e com maiores faturamentos. Deu-se muito dinheiro
para empresas já consolidadas, que conseguiriam se financiar de outra forma no
mercado, e que migraram para uma carteira mais barata. Da perspectiva do BNDES,
é bom diversificar e, para a economia, também, porque, como o empréstimo do
BNDES se dá com taxas mais baixas, há condições para isso favorecer um poder de
monopólio”, destaca Lins.
A
professora de economia política do Departamento de Relações Internacionais da
PUC Rio Luciana Badin também vê na queda de repasses autorizados no ano passado
o efeito do momento econômico que o país atravessa.
“Qual
empresário vai buscar financiamento em um cenário que apresenta uma crise em
desdobramento? O financiamento acaba se concentrando em empresas mais sólidas,
com mercado bem definido”, explica a pesquisadora.
Luciana
ressalta que estruturalmente o BNDES foi constituído para financiar grandes
projetos de política de desenvolvimento e, por conta disso, a maior parte do
crédito acaba direcionada às grandes empresas.
“É
fundamental a maior participação da sociedade na atuação das linhas do banco,
tentando redirecionar o BNDES para um sentido mais público. O branco tem que se
reinventar, se reestruturar, para se tornar mais acessível, mais promotor de um
tipo de desenvolvimento que realmente favoreça o conjunto da sociedade. É
importante é que esse momento seja de repensar seu papel”, defende Luciana.
Professor
do Instituto de Economia da UFRJ, Luiz Carlos Prado afirma que é esperado que
em um banco de desenvolvimento haja concentração, já que envolve operações com
volumes substanciais, de longo prazo, e está sujeito a ciclos de investimento.
Segundo Prado, não se trata de uma característica particular do BNDES.
“Se
houver onda de investimento e privatizações, ou se um determinado setor
demandar equipamentos, por exemplo, vai haver concentração grande”, avalia.
Para
o professor da UFRJ, um fator que pode explicar a alta concentração é que
setores industriais voltados para o mercado doméstico, mais sujeitos à crise,
tendem a demandar menos financiamento.
“Aqueles
que foram menos afetados, que independem da situação atual, vão manter a
procura por financiamento. Empresas concessionárias, por exemplo, têm
obrigações regulatórias de investimento” complementa o economista.
Fonte: Portal O Sul
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