Um relatório do Tribunal de Contas do Município (TCM) aponta que duas
organizações sociais (OSs) causaram um prejuízo aos cofres públicos de R$ 30,1
milhões. Com esse dinheiro, seria possível custear o pleno funcionamento de um
hospital do tamanho do Souza Aguiar, no Centro, durante um ano inteiro. O
contrato inspecionado pelo tribunal se refere à administração da Maternidade
Maria Amélia Buarque de Hollanda e da Coordenação de Emergência Regional (CER)
Centro, ambas no Centro. Essas unidades municipais são geridas desde julho de
2015 pela OS Instituto Gnosis.
De acordo com o relatório, ela é responsável por causar um prejuízo de
R$ 10 milhões. Nesta semana, no entanto, o contrato com a OS foi renovado por
mais dois anos. Já a OS Instituto SAS, que era a responsável pela gestão das
unidades de 2012 a 2015, teria causado rombo de R$ 20 milhões apenas no
processo de rompimento de contrato, em julho de 2015.
Entre as irregularidades do Instituto Gnosis apontadas pelo TCM, está a
compra de medicamentos com valores, em média, 117% maiores do que os praticados
pela Secretaria municipal de Saúde (SMS). Um desses medicamentos foi adquirido
com 1.831% de sobrepreço. Em janeiro de 2016, a SMS decretou uma nova norma que
prevê punições a OSs que comprarem remédios acima do preço praticado pelo
órgão. Após isso, o Gnosis conseguiu se adequar à norma, com redução imediata e
significativa dos valores.
A OS alega que a análise dos valores foi feita de "forma fria pelos
técnicos do TCM". Segundo a organização, o tribunal não levou "em
consideração o cenário daquele momento: havia uma grave restrição de crédito
das unidades em razão da inadimplência do antigo gestor e baixíssimo estoque de
medicamentos, o que demandou compras emergenciais para suprimento imediato,
para o não prejuízo à saúde da população".
Destacou ainda que "algumas
distorções apontadas se deram por divergência em relação à unidade de medida do
medicamento (ex: caixa fechada ou unidade individual), o que obviamente causa
diferença". A nota do Gnosis acrescentou que, sobre a compra de um
medicamento com valor 1.000% superior à tabela da SMS, "alguns problemas
sazonais, como falta de matéria-prima de determinado medicamento no mercado,
influenciam no processo de compra". Segundo a OS, "em 2015 houve
grave desabastecimento de antibióticos essenciais, fazendo com que o preço
unitário fosse elevado".
Entre as irregularidades apontadas pelo TCM, estão o pagamento de R$ 2,5
milhões (sendo R$ 2,2 milhões em recursos humanos e R$ 300 mil em custeio) por
uma UTI pediátrica que nunca existiu. Em nota, a OS Gnosis afirmou que "muitos
documentos não foram analisados pelos técnicos do TCM, em especial o 2º Termo
Aditivo ao contrato, de 25 de novembro de 2015, que suprimiu integralmente as
verbas questionadas no relatório relativas à UTI pediátrica" e que, assim,
o dinheiro foi devolvido ao governo. De fato, o relatório leva em consideração
na inspeção um período posterior ao termo aditivo, sem citar se levou, ou não,
o documento em consideração.
A Gnosis afirmou que trata-se de um relatório preliminar.
"Portanto, não é uma condenação à nossa gestão, apenas um pedido de
comprovação de gastos", informou. Ela também negou outras irregularidades
citadas pelo TCM, como problemas contábeis e a contratação de uma empresa que,
numa licitação, apresentou um valor maior que as outras concorrentes. Alega
ainda que o relatório aponta melhorias na unidade em sua gestão.
A OS anterior à Gnosis causou prejuízos maiores, segundo os técnicos do
tribunal. De acordo com o relatório, o Instituto SAS, que posteriormente trocou
de nome para RPS, recebeu duas parcelas para realizar os serviços de junho e
julho de 2015 (R$ 6 milhões), 17 dias antes de abandonar o contrato. De acordo
com o relatório, eles nem pagaram o mês de junho dos funcionários - e a
prefeitura teve que tirar R$ 1,8 milhões do Souza Aguiar para cobrir o rombo
deixado pela OS.
O Instituo SAS alegou à prefeitura que abandonou o contrato porque
precisava de reajuste.
No entanto, nesse mesmo período os donos da OS estavam
sendo presos em São Paulo acusados de fraudes na gestão de um hospital em
Itapetininga.
Em nota, a gestão Eduardo Paes alegou que realizou a rescisão do
contrato com a instituição e abriu uma tomada de contas especial, pois a OS
alegava uma dívida da secretaria com a instituição.
"Os valores pagos à OS supriam o aviso prévio e a rescisão
trabalhista", informou. Ainda de acordo com a nota, somente após a
finalização da tomada de contas especial, que ainda será feita pelo TCM, é que
será possível abrir um processo solicitando a devolução de recursos, se a dívida
for comprovada.
O TCM fez a inspeção extraordinária a
pedido do vereador Paulo Pinheiro (PSOL), motivado pela prisão dos donos da
SAS. O relatório seguiu para o conselheiro José de Moraes Correia Neto, que
votou, em maio, pelo prosseguimento das diligências. Por isso, o TCM enviou
questionamentos às OSs e à SMS para esclarecer dúvidas e, a partir daí, cobrar
o montante que for comprovado como gastos irregulares.
— Temos que acabar com essa sangria. A
Secretaria de Saúde diz que não tem dinheiro e que precisa de uns R$ 400
milhões para fechar o ano. Está aí uma boa maneira de economizar. Caso se
comprove as irregularidades, já são R$ 30 milhões — disse Pinheiro. — Estamos
pedindo a inspeção para ver se houve irregularidades.
A SMS informou que está levantando as
informações necessárias e que tem até 28 de julho para responder ao TCM. Disse
ainda que já foi aberto processo de tomada de contas das OSs.
Fonte: O Globo